O papel estratégico da Gestão de Armazém na Cadeia de Abastecimento
19 julho 2023Artigo de Alexandra Pinto, consultora de Gestão e Engenharia Industrial
no INEGI
O armazém desempenha um papel vital na gestão da cadeia de abastecimento, tendo como principal função permitir a constituição e manutenção de stocks, assegurando a disponibilização do produto ao cliente, no equilíbrio ótimo de custo e serviço, cumprindo com a proposta de valor definida. Fazendo parte da Cadeia de Abastecimento, o armazém sofre as mesmas pressões de rapidez de resposta, elevado nível de serviço e redução de custo operacional sentidas na cadeia.
Verifica-se, no entanto, que muitas empresas têm o seu expertise na produção ou na área comercial, sendo a gestão logística, e em particular o armazém, uma área muitas vezes negligenciada. Historicamente, o armazém é visto como um depósito de bens, e também de custos.
A nossa experiência em projetos de consultoria nesta área permite-nos afirmar que, muito pelo contrário, a correta gestão da armazenagem acrescenta valor em termos de serviço ao cliente, baixa os custos totais logísticos e facilita o fluxo na Cadeia de Abastecimento.
O armazém é um elemento chave da cadeia de abastecimento?
Existe no contexto atual, no entanto, um conjunto de fatores que tem vindo a contribuir para um papel cada vez mais determinante do armazém no sucesso da gestão da cadeia de abastecimento e na concretização da estratégia da empresa.
Com o crescimento acelerado das vendas B2C e do canal online, é exigida uma entrega mais rápida, com maior flexibilidade e a custo mínimo. A pressão do prazo de entrega propaga-se a montante na cadeia de abastecimento impactando também nas empresas industriais. Isto acontece, muitas vezes, em contextos em que as empresas têm já margens comerciais reduzidas e em que outros elementos de custo, nomeadamente o de transporte, sofreram aumentos significativos. De um modo geral, a expectativa do cliente em relação ao nível serviço é elevada e as empresas deparam-se com dificuldades em corresponder a essa expectativa, sem alterar de forma significativa as suas operações logísticas e sem refletir aumentos de custos no cliente. As encomendas têm tido uma tendência tipicamente de baixas quantidades e multi-produto, o que impacta significativamente o seu custo de preparação, em particular se a operação de armazenagem não tiver sido ajustada a esta realidade.
Paralelamente, verifica-se nos últimos anos um aumento significativo da procura por espaços de armazenagem num cenário de escassez de oferta, e crescem as dificuldades de captação e retenção de talento para funções logísticas de uma forma transversal.
Acresce ainda aos requisitos pedidos ao armazém o facto de que num mercado em que aumenta a procura pela customização, e em que esta procura é muitas vezes incerta, existe uma tendência crescente para modelos do tipo assemble and ship to order, em que é dada prioridade a stocks genéricos que podem ser customizados em armazém de acordo com os requisitos finais do cliente.
O armazém desempenha neste contexto acelerado e de mudança, um papel ainda mais determinante no sucesso da operação, com o risco de constituir um ponto de estrangulamento, sem capacidade de resposta para garantir os níveis de serviço esperados internamente e comunicados ao cliente. É típico em empresas industriais proceder-se a projetos de investimento para ganhar alguns segundos nos processos produtivos, para depois em armazém se perderem minutos, horas e dias em processos não otimizados.
Como se avalia o desempenho de um armazém?
A performance do armazém influencia de forma significativa a capacidade de diferenciação de uma empresa, por exemplo, através do seu potencial para a redução de custos e otimização de níveis de serviço, ou permitindo a realização de operações finais de valor acrescentado que podem contribuir para o aumento do valor do produto e melhorar a experiência do cliente. Ou ainda servindo como plataformas de cross-docking, consolidação ou transhipment que permitem reduzir os custos de transporte.
A operação de armazenagem deve por isso ser pensada em total alinhamento com a estratégia da empresa, tendo em conta dimensões como:
- Localização;
- Layout e uso do espaço;
- Equipamentos de armazenagem e movimentação;
- Processos de receção, conferência, arrumação, picking, embalagem e expedição;
- Automatismos;
- Sistemas e tecnologias de informação;
- Níveis de serviço definidos;
- Sazonalidade na produção ou procura;
- Requisitos de customização ou adição final de valor.
Um estudo recente da McKinsey & Company1, aponta as seguintes causas como as principais causas para uma deficiente performance da operação de armazenagem:
- Ausência de uma estratégia de foco tecnológico para a melhoria da eficiência e qualidade;
- Falta de metodologias e de uma abordagem estruturada para a identificação de causas raiz para os baixos níveis de performance;
- Não existência de um projeto de melhoria contínua para a excelência da operação de armazenagem;
- Falta de uma perspetiva end-to-end da cadeia de abastecimento que considere a totalidade dos seus processos, custos e interfaces com cadeias de abastecimento externas.
É essencial avaliar de forma contínua a performance da operação de armazenagem com o objetivo de identificar desalinhamentos relativamente aos objetivos definidos e definir soluções neste seguimento. Esta avaliação de performance é normalmente realizada através da definição clara de indicadores e sua contínua monitorização, nomeadamente:
Indicadores de produtividade - capacidade da equipa em operar com elevados níveis de performance – ou seja, se as equipas entregam os resultados dentro dos prazos definidos pela gestão. Através da monitorização destes indicadores é possível identificar gargalos operacionais e oportunidades de otimização.
Indicadores de capacidade - capacidade operacional disponível - por exemplo, se existem sobrecargas em alguma área, ou por outro lado, se existe capacidade que não esteja a ser utilizada.
Indicadores de qualidade - conformidade do trabalho realizado em relação aos padrões definidos pela gestão e esperados pelo cliente. Estes indicadores são utilizados para compreender se o serviço atual corresponde às expectativas do cliente. Permitem a otimização de níveis de serviço e a criação de diferenciação no mercado.
Indicadores estratégicos – diretamente relacionados com os objetivos estratégicos do negócio - permitem avaliar a operação de armazenagem está em total alinhamento e a suportar a estratégia de negócio.
As tecnologias de informação podem ajudar?
O potencial impacto da tecnologia nos níveis de produtividade e eficiência, assim como na redução de riscos e promoção de maior ergonomia nas diferentes funções, é enorme. Este é um dos eixos prioritários de consideração quando se pretende otimizar a operação de armazenagem.
Com investimentos recorde nos últimos 5 anos, a inovação a este nível tem sido notável e existem inúmeros "case studies” de sucesso. O portfóliode soluções é amplo e com relativa maturidade em diversas áreas, como seja, por exemplo, na utilização de robots para auxílio às operações de picking, na implementação de sistemas WMS (Warehouse Management Systems) com soluções de otimização dinâmica de rotas de picking, ou implementação de soluções automáticas para a separação de artigos, entre inúmeras outras.
Entre as tecnologias com maior potencial de aplicação às operações de armazenagem destacam-se:
- Robots / Cobots
- Exoesqueletos
- AGVs – Automated guided vehicle / AMRs – Autonomous Mobile Robots
- IA – Inteligência Artificial / ML – Machine Learning
- Blockchain
- RV – Realidade virtual / RA – Realidade aumentada
- IoT – Internet of Things
- Digital Twins
- WMS – Warehouse Management System / WES – Warehouse Execution System
- Sistemas de armazenagem automáticos
- Sistemas de separação automáticos
- SoluçõesPick To Light / Put To Light
- Voice Picking
- RFID
- Drones
Na definição de iniciativas de automação ou digitalização da operação de armazenagem é essencial garantir o alinhamento destas iniciativas com a estratégia da empresa, apostando em use cases selecionados com um retorno de investimento claramente identificado, e para os quais existe o buy-in dos diferentes stakeholders. Os casos de sucesso existentes confirmam que existe maior valor em iniciativas cirúrgicas e estratégicas de transformação digital, do que em megaprojetos de complexidade excessiva que, na maioria dos casos, inviabiliza o seu sucesso numa fase muito precoce.
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Referências